quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Natal em meu Castelo de Lego


Natal sempre me foi uma data estranha. O que acaba de passar, no entanto, foi um pouco diferente.

Estive os últimos dias, depois dos meses turbulentos desse segundo semestre, em tempo integral com minha família. Sem ter deixado de conviver com meus familiares, tive a nítida sensação de estar voltando de uma longa viagem, de desconhecer os detalhes do cotidiano de minha irmã, os problemas da empresa tão constantes nas conversas de meus pais.

Vivi esse ano muito intensamente os desafios da faculdade, os problemas dos amigos. Vivi em um outro mundo, convivi com outras pessoas. Viajei bastante, acompanhado por Deus encarei o desconhecido, aprendi muito. Assumi responsabilidades, alcancei objetivos almejados. Tomei decisões que feriram a alguns, de mim afastaram outros. Também fui ferido e apenas a poucos me mostrei nas horas mais tristes. O fiz na tentativa de não sufocar em meio a angustia, uma porção de medo e outra de decepção misturados a completa confusão.

Foram dias difíceis os que passaram, mas em que pude ser feliz. Aprendi lições que trarei na memória por toda vida. Quem sabe um dia as ensinarei a meus filhos...

De tudo que foi tristeza o que me resta agora é uma esperança florescente no por vir. Estar junto a Deus nas guerras travadas não evitou que fosse ferido dolorosamente durante os embates, mas possibilitou a cura sem deixar marcas, sem formar cicatriz.

Hoje, junto de minha família, acho que entendo um pouco melhor o que é Natal. Não ganhei presentes, nem os dei também. Esse é um hábito que nunca mantivemos. Porém, recebi algo de valor que não pude calcular, algo subjetivo que só agora, depois de caminhar sozinho pela praia deserta na manhã desse domingo, percebo.

Simplesmente compreendi que tenho uma vida perfeita. Tenho uma família unida, posso sentir Deus junto a mim, trago no peito uma esperança incansável, vejo um futuro cheio de oportunidades, adoro a profissão que estou seguindo, já provei do amor e estou pronto para amar novamente. Em suma, percebi que cada parte da minha vida está em seu lugar. É como se o castelo de Lego que, quando criança, tentava e nunca conseguia arquitetar, finalmente estivesse terminado, com cada peça devidamente encaixada.

Natal não deixará de ser uma data estranha em que um senhor de barba branca e barriga grande vestido de vermelho promete presentar os bons meninos no último mês do ano. Sinto, contudo, que os dezembros terão outro significado, outro valor. Será para mim, a partir de agora, o momento de observar e perceber que o castelo que construí é exatamente como desejava, e que permanece habitado por aqueles que verdadeiramente me fazem feliz.

Talvez, Natal seja apenas isso...

sábado, 27 de novembro de 2010

De perfumes, músicas e lugares esquecidos



Tenho sido só saudades nesses dias. Aquela música, um certo perfume, os lugares que me fazem lembrar de coisas que vivi me interpelam a todo momento. Vem a sensação que nunca consegui definir se boa ou ruim, se gostaria ou não de sentir.

É algo que sequer pede permissão para entrar no peito e, quando percebo, já me dominou por completo. Trazem de volta o que um dia acabou, alguém que há muito partiu. Nem sei como isso acontece...

As vezes acho que tudo não é mais que consequência de um clima mais ameno que domina esta época do ano. Dias de chuva me tornam melindroso, me deixam um tanto carente... Junta-se a isso essa atmosfera de fim de ano. As festas e comemorações, mais uma vez, só pioram minhas emoções. Tento lembrar como estava há um ano, em quem pensava, o que planejava. Inevitável nã calcular as perdas e ganhos do ano.

O que me deixa triste, agora, no entanto, é a certeza que há balanço negativo, desde já, este ano. Ganhei muito, é bem verdade: vivi mais intensamente, estou apaixonado por algo que farei por toda minha vida, conquistei o espaço que almejei... Perdi menos vezes, mas nos pontos mais valiosos: perdi amigos, pessoas a que amava, perdi um pouco da força que tinha, da esperança que me impelia.

Porém, de um modo ou de outro, continuo. Incompleto, com o que há de mais nobre em um viver sufocado, procrastinado. Forçadamente esqueço o que doeu nos dias que passaram. Os perfumes, músicas e lugares continuarão a me importunar, sorrateiramente continuarão a me assaltar, trazer um pouquinho da algia sentida de volta. Mas, aí, 'guento, me recolho em recordações, fujo em meus livros, me embalo ao som de um piano.

Depois que passar, nego tudo: nunca sinto saudades de ninguém, mesmo que a falta de um certo você tenha me inspirado a isso escrever.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O João-de-Barro e a Passarinha


Um dia ele enfim encontrou uma companheira. No futuro, agora não seria mais sozinho, o João-de-Barro. Sempre estaria com ela, pensando nela, feliz com ela.
Não foi fácil para o pássaro bobo e e pouco experimentado nessas coisas de sentimento aceitar sua louca paixão por aquela passarinha. Só fez isso quando já não podia enganar a si mesmo e, assustado com a idéia de se tornar um mentiroso, passou a se aceitar como vassalo de sua amada.
Ela fazia o tipo independente, teimosa e muito experiente, mas nada além de uma garotinha linda que vivia a sonhar em um "não-sei-quê" o dia todo. Era imaginativa, inteligente, interpretava metáforas como ninguém. Só um defeito possuia, mas aquele a que a tudo atrapalharia: ela, a passarinha, não gostava do João-de-Barro.
Para ela isso estava claro, no máximo o que teriam seria uma aventura, ou nem isso se duvidassem. O pequeno fato que, mais tarde, arrasaria o pobre passarinho é que ela jamais revelaria a verdade assim, tão aberta e sinceramente. Não, claro que não... Afinal, não perderia essa perversa diversão. se divertiria primeiro com o tolo a quem conquistara.
E assim aconteceu. Ele fez tudo, absolutamente tudo mesmo por ela. Já não cantava para outra se não para ela. A meia dúzia de pensamentos que carregava em seu cérebro minúsculo de passarinho estavam sempre nela. Vivia para aquela que imaginava ser sua passarinha. Até construiu uma casinha para os dois viverem juntos. Por dias trabalhou para isso, buscando barro na ponta do bico para modelar seu ninho. Fez tudo e com tanto amor que não se deu conta do que estava acontecendo.
Ela, sempre daquele jeito bandido, seduzindo o pobre coitado. Tudo nela parecia um feitiço para ele. Os olhos, brilhantes e cor-de-mel; o voar, com um bater de asas que aumentava a pulsação de João; o perfume, o inebriava; também as penas, o bico, a voz e tudo mais que fosse dela. Estava perdido, enfim, condenado!
A passarinha, todavia, sempre naquela, "não te quero, mas fica do meu lado". E ele, sem opção (não que quisesse uma...), ficava.
E assim foi, um mês, dois, seis e um ano. Até brigaram uma vez, mas depois voltaram ao mesmo jogo, bastou ela fazer sinal.
Aí, um dia, ela (claro!) decidiu acabar com tudo, sem dizer nada. Apenas falou que iria embora, para outro lugar, outra vida. Tinha cansado daquilo em que vivia (dele).
E foi... Numa manhã de outono partiu.
Dele nunca mais se ouviu falar.

sábado, 25 de setembro de 2010

I'll see you soon...


"In a bullet proof vest, With the windows all closed, I'll be doing my best, I'll see you soon, In a telescope lens, And when all you want is friends, I'll see you soon."

Não é que sempre esteja me escondendo dos olhares alheios, ou que possua segredos indizíveis cá dentro. Apenas mantenho “the windows all closed” para garantir a segurança das poucas coisas boas que há em mim. Prefiro estar assim, “ in a bullet proof vest”, um tanto desconfortável, pouco espontâneo, mas vivo...
Talvez tenha encontrado quem me faça querer tirar o colete, abrir as janelas, "and be the one when all you want is just a friend."

I'll see you soon...

sábado, 21 de agosto de 2010

Gênesis de um homem melhor


"Cristal quebrado, tesouro roubado, gelo em brasa, asa nada, água de mar, olhar dourado, libido casto, não ficou rastro do meu amor, se perdeu, naufragou..."

E foi assim que ele deixou se perde o orgulho que sempre trouxe consigo. Falou tudo que tinha que falar, confessou o mais insano desejo que por meses acalentara. Não estava arrependido do que fizera, afinal nem fora uma opção a entrega, a doação. Apenas tinha de ser assim... Estava, agora, cansado de tudo isso. Seria bom ter um colo onde chorar. Na falta disso, voltou para casa, seu abrigo abandonado, o porto há muito deixado.
Fizera mais do que o possível, mais até do que poderia ter feito. Doou de peito aberto o maior amor do mundo, sem medos. No início tentou se proteger, evitar grandes danos. Depois, esqueceu disso. Se tinha de ser, que fosse de corpo inteiro. Viveu aquilo como quem vive pela primira vez na vida. Tentou de tudo, fez de tudo. Só não queria confessar, se entregar com palavras. Era orgulhoso e detestava falar do que sentia, do que intimamente desejava. Se entregava, sim, sempre, em tudo mais: gestos, atitudes, olhares. Com palavras, não. Estas reservara, desde sempre, em um baú de onde nunca deveriam ser retiradas. Prometera até, certa vez, nunca tirá-las de lá. Leda jura a dele...
Um dia, então, se entregou, confessou, nada negou, abandonou todos os controles. Já havia dito de todas as outras formas que poderia dizer, mas não fora suficiente. Era que ainda não havia falado da maneira que desejavam ouvir. Lhe pediram a confissão clara e aberta, sem metáforas, sem rodeios, de forma direta. Sem escolha, fez: falou, disse, confessou, se entregou. E foi rejeitado, claro...
Era apenas o fim do jogo. O gato não mais iria perseguir o rato, a história já não seria como antes. Sentia-se humilhado, com o orgulho pisado. Se era para negar de maneira tão imediata, por que então pedir a confissão. Queriam apenas lhe humilhar. Qualquer um sabia que ele era orgulhoso. Agir daquele modo não fora justo.
Apesar do mal feito, ele não chorou. Doeu, sempre doi muito. Mas em muito mudara. Apredera que o nunca não existe, que a vaidade pode fazer mal, que o orgulho fazia parte dele, mas que poderia viver bem sem ele. Estava, agora, ferido e ainda sangrava. Sabia, porém, que as feridas sempre cicatrizam, que as dores um dia passam e que a vida continua. Se ocuparia com muito trabalho, deixaria de pensar em sua própria vida por uns dias, escutaria mais os problemas dos outros. Queria mesmo era viajar. Sem poder, os livros na estante já tão sem importância lhe fariam compainha. No final, ficaria bem, estaria inteiro, mesmo que marcado.
Não queria vingança, não gostava disso. Queria apenas viver. Orgulhoso ele sempre seria, confesar não deixaria de ser difícil. O fato, porém, era que agora sabia ser forte o suficiente para sobreviver a confissão, a rejeição e ao orgulho pisado, tudo junto. Se arriscaria mais a partir dali. Sofreria e sorriria mais vezes e mais intensamente. Seria um homem melhor.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Broken


Relações partidas, caminhos, enfim, divididos. Depois de muito compartilhar, conviver, repartir, vem em um dia e acontece: a separação, o fim de uma relação, o acabou, e só. Nada premeditado, é bem verdade, mas bastante previsível. Os dias em que se ficou distante, as novas relações não compartilhadas tratam de, sorrateiramente dividir o que antes era unido, quebrar o que parecia ser estável. Chega o momento em que os caminhos se separam, cada um segue sua própria estrada. Bobagem querer mudar isso. Melhor deixar seguir rio, que as águas corram sem desvio de direção.

Parece que só sobre isso escrevo: separação, partida, despedida. Talvez apenas isso tenha me inspirado suficientemente, ou a ideia de não mais estar junto evoque algo mais forte que o romantismo de quando tudo vai bem.

Desde cedo aprendi a ficar só. Não que minha família me ignorasse, ou que fosse depressivo a ponto de evitar as pessoas. Apenas preferia fazer as coisas a meu modo, sem intervenções indesejadas, oposições desnecessárias. Sob a justificativa de que ser independente, era mais eu do que qualquer um. Cresci entre meus livros, vaguei sem companhia por meus devaneios. Filosofia máxima?! Antes só que mal acompanhado. Verdadeiramente não me importava com isso, estava bem daquele modo. Acho que me bastava.

As coisas mudam, porém. A gente vai envelhecendo (alguém preferiria amadurecendo) e o jeito de viver vai mudando. Passei a querer ter amigos, ser cercado de pessoas, ser tido como companhia desejável. Nem sei se consegui tanto, mas em muito minha maneira de conviver se transformou. Tateando entre perdas e ganhos compreendi que dividir as dores pode ser bom, e que compartilhar as alegrias melhor ainda. Estar junto, desejando estar exatamente daquela maneira, é algo que me faz sentir pleno. A vida fica melhor, assim. Os fardos se tornam menos pesados quando há alguém para ajudar.

Não deixei, de todo, contudo, meu lado solitário. O que em mim se habitou ao vento frio dos tempos em que estive só, hoje me seduz, recorrentemente, para a quebra de tudo aquilo que chegou ao estável. É como se nada em mim aceitasse a estabilidade. Há um algo cá dentro que anseia pelo não previsto, pela cena ocorrida no tempo prorrogado. Não suporto as rotinas, não consigo respeitar os horários, detesto seguir as receitas. Do mesmo modo não consigo permanecer em uma relação da qual saiba exatamente o que esperar. É fatal, sei, mas quando a procura das intenções acaba, há, de fato, a relação a se partir. Quando a insegurança gerada pelo desconhecido se desfaz não há porque continuar. Se o mistério se perde, acaba com isso o jogo. O outro, para mim, em uma relação, deve ser sempre uma caixa de surpresas. Surgirá daí, a fidelidade, a confiança, quem sabe até amor.

Por mais que, um dia, os laço se rompam, acredito que vale muito tê-los construído. São vitais, até. Entendi, depois de alguns dias que as mãos que um dia estiveram cheias nunca ficam completamente vazias. Sempre fica um algo depois da partida. As vezes propositalmente, outras apenas porque o tal algo por tanto tempo foi compartilhado que não pode ir com seu original dono: se partiu, metade foi, a outra ficou.

Hoje algumas relações se partiram, em mim. Uma foi assim, de uma só vez. Por mais que já pressentisse, me assustei. A outra mandou aviso ao longo dos meses, foi se partindo de fio em fio. Talvez até restem alguns...

Não há tristeza, aqui. Apenas a certeza de que, com alguns, cheguei a um fim. Há espaço, agora, para coisas novas, pessoas novas. Alguém se candidata?!

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Ele em busca dela

Amou desde o primeiro instante em que a viu. No começo se acreditava apenas encantado pela beleza que ela trazia. Com os dias, percebeu que era mesmo a perdição de amar, enfim. A ninguém revelou o segredo: coisa sua, não tinha porque falar para mais alguém. Gostava dela em silêncio, na surdina. Assim, era confortável: não tinha de se declarar, não corria o risco de se decepcionar e poderia continuar lhe gostando só no olhar.
Um dia ele começou a querer mais. Não admitiu isso sequer para ele mesmo. Tinha esse dom: quando queria, podia fingir até para si mesmo. E assim o fez, usando o pretexto de que ela precisava de melhores companhias (ele, claro!), se achegou aos poucos, para conhecê-la melhor e tentar armar um modo de conquista-la. Descobriu muitas coisa. Ela adorava dançar, era louca por sorvete e tinha preferência por vermelho-escuro. Usava um perfume de notas cítricas que, ao que lhe parecia, realçava a vida que havia nela. Adorava roupas. Um dia, como que se confessasse para ele, revelou que todas as manhãs, passava quase uma hora decidindo com se vestiria naquele dia. Em outras circunstância, ele lhe diria, sem titubear, que ela era fútil, mas achou aquilo lindo, e adoraria poder assisti-la todos os dias encenar seu dilema matinal.
Tanto ele se dedicou e insistiu, que ela aceitou, a amizade. Ela agora lhe revelava tudo. E o que não deixava claro, ele subentendia. Era muito bom nisso. Passaram a sair juntos, assistir filmes juntos, até cozinhar na casa dela. E conversavam, interminavelmente, mas nunca concordavam, invariavelmente. Era divertido, para ela, estar com ele. Lhe fazia bem, talvez mais feliz. Para ele era a da dose diária de uma droga em que se viciara. Era dependente dela. E só agora começava a perceber.
Ela viajou. Iria passar um mês na casa dos pais. Tormento para ele. Sabia-se dependente, mas não tanto. Pensava nela a cada instante. Empregou toda sua criatividade para manter uma comunicação diária com ela que, como se precisasse daquilo também, lhe correspondia. Naqueles dias, pode conhecê-la melhor do que nunca. Com a distância ela se mostrava por inteiro, falava de seus segredos, medos e incertezas.
Falou, um dia, também de um amor que tivera tempos antes e que, na visita a casa dos pais, reencontrara. Ela disse não saber se ainda gostava do tal amor, mas que tinha saído com ele e umas amigas de escola. Ele a escutou calado. Sempre usara o silêncio como arma a seu favor. Desta vez, sua mudez o denunciava. Titubeou algumas palavras e desligou. Só voltaram a se falar três dias depois. Ela voltaria no dia seguinte, e queria saber se ele poderia ir lhe esperar. Com poucas palavras e sem vontade própria disse sim e desligou. Já não sabia como conversar com ela.
Aqueles foram dias de dor. Antes, remediado pela presença dela, mesmo que ao telefone, suportava o que lhe corroía por dentro. Agora, depois de se perceber um amigo confidente, e apenas isso, não conseguiria suportar tudo aquilo. Estava certo de que ela nunca o amaria. Confundira as regras. Tudo era culpa sua. Ela nunca o engara, eram amigos, apenas. Agora, não era capaz de suportar aquilo tudo. Decidiu, então, afastar-se dela de uma vez. Seria melhor para os dois. Evitaria dor, para ele, e constrangimento, para ela.
Como prometera, foi espera-la no aeroporto. Havia nos olhos dele uma mistura de sentimentos. Estava feliz, por poder revê-la depois de semanas; triste, por saber da proximidade da separação que ele mesmo estabelecera; sentia medo de não saber como recebê-la, depois de tudo. Somente a presença dela, do outro lado da vidraça, acenando, pode lhe tirar da confusão em que mergulhara.
E como estava linda, ela. Empunhando a imensa bagagem que trazia, dirigiu-se para ele e o abraçou. Perdido no perfume dela, ele, mais que antes e como sempre, soube que a amava. Não disse nada do que havia ensaiado por toda noite, nem a beijou, como secretamente havia desejado. Apenas sorriu e disse que estava com saudades. Ele pegou as malas e a levou até em casa. Ela o convidou para entrar, mas ele recusou, disse estar atrasado para um compromisso. Ela não insistiu. Apenas agradeceu, por tudo, o abraçou novamente e pediu que a visitasse logo: tinha muitas coisas para lhe contar. Ele apenas anuiu.
Seguiu para casa. A noite, em vão tentou dormir. A imagem dela, o perfume, o sorriso, tudo estava gravado nele. Não pode simplesmente deixa isso de lado e esperar pelo momento certo, se é que existiria. Teria de fazer algo, e logo, agora. Só não sabia o que, nem como.
O sol acabava de nascer quando ele, por fim, saiu de casa. Já não lhe importava se pareceria ridículo dizer tudo a ela. Talvez ela até já soubesse, mas para ele era a única opção. Teria de acorda-la, surpreende-la ainda sonolenta. Quem sabe isso até não ajudaria. Ela, ao acordar, estaria desarmada e não teria muito como reagir a ponto de lhe decepcionar.
E foi, bravamente, sem nem mesmo saber porque, em busca de um algo menos insuportável que aquele aperto que trazia no peito. Foi em busca de um fim para aquilo tudo, o ponto final que lhe devolvesse a paz perdida desde o dia em que a conhecera. Não esperava um sim, nem imaginava receber um não. Ele buscava apenas sua vida de volta, fosse com ou sem ela ao lado.

Coisas Minhas


Com o tempo aprendi que nem sempre os melhores amigos serão bons colegas de trabalho, que não preciso estar sempre por perto para ser lembrado, que a vida é muito curta para ser desperdiçada com medo, tristeza e solidão e que para ser sincero não preciso ferir ninguém.

Entendi que o silêncio fala mais que qualquer palavra, que a música tem poder de comunicar o indizível e que o olhar tem vontade própria e não sabe mentir. Passei a ter mais fé em Deus, a sonhar mais vezes e mais alto, a sorrir mais (chorar também), mas a me culpar menos. Compreendi que viver não é fácil, que o amor é fundamental e que crescer dói.

Errei várias vezes. Machuquei muitos dos que me amavam. Perdi (ou deixei que se perdesse) quem mais importava. Desfiz os meus trançados mais trabalhosos, abdiquei das conquistas mais valiosas. Fiz da vida um contrassenso, paradoxo desagradável. Evitei a forma definida, brinquei com a imaginação dos que me cercavam. Para muitos fui o bobo, inútil de poucas habilidades. Para outros, maquiavélico, manipulador despreocupado com os meios, orientado pelos fins. Nem sei se alguém me viu de verdade...

Busquei sempre o bem. O espanto é que, tentando, por vezes fiz o mal, fui mau. E, por mais que se queira fazer crer o contrário, perdão é coisa rara, difícil de se dar e, para mim, um martírio receber. Não foram poucas as vezes em que preferir abandonar tudo a ter que pedir desculpa, receber o perdão de quem sangrava por minha culpa. Talvez por orgulho, ou auto-punição, nem bem sei.

Foram poucas as vezes em que permaneci no filme até o final. Não sou paciente a ponto de esperar a última cena acabar. Apenas enceno até o momento em que a vida pode ser salva, enquanto o olhar ainda não pode machucar. Depois que a confiança se perde, que a intimidade é ferida, não há como voltar ao zero e fazer de novo. Quando o cristal é quebrado (e aqui soo brega), o que há a fazer é juntar o indispensável, por tudo em uma pequena mala e partir, sem avisar, sem se despedir, sem ter ao menos destino. Ir, somente por ser esta a única maneira de manter-se digno. Já nem sei quantas vezes fiz isso.

Não defino tal ato como abandono ou fuga. Prefiro “partida”, “recomeço”. Sempre que parti levei comigo muito daqueles com quem convivi. Deixei muito também, mas quase sempre foi insuficiente. Dentre o que trouxe há sempre um jeito de falar, um gesto mais característico, um hobbie que adquiri com quem me abrigava. Ganhei, também, muitas memórias, que as vezes me fazem reviver o tempo bom que vivi antes de um algo se romper. Os perfumes, musicas, as vezes a comida, um filme, um livro, uma palavra, um nome... Há sempre um algo que me faz lembrar a quem um dia tive.

Sei que Deus tem sido bom comigo. Generoso, Ele. Tenho tentado, tortamente, retribuir. Sigo tateando o escuro, buscando orientação em meio as confusões em que me perco. O que aprendo tento ensinar. Quando caio, olho para cima e levanto depois de chorar. Ainda não achei o grande amor que me disseram que iria encontrar. Nem tive o filho ou plantei a árvore que deveria plantar. Li apenas o livro, mas já é um começo, e quero continuar.

Não espero que a vida me dê grandes papeis. Quero apenas encontrar quem me faça ir até o fim, que me faça ficar, esquecer a partida e aceitar o perdoar. Já esperei tanto, posso mais um pouco, aguento um pouco mais.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

O Menino


Um dia o menino saiu de casa. Levava consigo uma pequena sacola, dentro dela algumas peças de roupa. Do futuro, nada esperava naquele fim de tarde. Tinha apenas uma certeza: jamais retornaria.

Havia perdido os pais muito cedo. Sua única referência era um retrato antigo que desde sempre trazia em seu bolso. Logo que ficou órfão, foi levado para casa da avó, com quem viveu até os 11 anos. Tudo era triste desde esse tempo. A avó nunca perdoara o pai do menino. Acusava-o de ter lhe tirado sua filha única. Por ser, também, filho único, herdara sozinho o que pertencera ao pai: o ódio da carrasca. E como tal ela o tratava. Deu graças a Deus no dia em que finalmente morreu. Sem saber se no céu ou no inferno, desejava apenas que a avó se resolvesse com o pai. Nem desconfiava de quem poderia estar certo, sabia apenas que pouco ou nada tinha a ver com tudo aquilo.

Seu destino, depois do enterro da velha, era o abrigo municipal. Não fosse por uma tia surgida não se sabe de onde, teria se juntado aos outros miseráveis esquecidos pela sorte. Antes tivesse sido assim. Desta vez a sorte não apenas lhe esquecera como condenara. Saíra das mãos da avó louca para os domínios de uma tia tirana. Escravizá-lo, concluiu o menino anos depois, era seu único objetivo quando decidira “adotá-lo”. E fez de tudo: foi pedinte, vendedor, flanelinha, trombadinha, engraxate e, quando dava, estudante, afinal o governo até pagava.

Nada disso lhe doía. Para ele sempre fora assim, era aquele o caminho, inquestionável. Se a tia lhe maltratava, lhe chamava de vagabundo e preguiçoso, diferença nenhuma fazia. Ele era apenas um sem nome, sem história, mais um nada.

***

Um dia ele mudou. Levantou cedo, como sempre, e saiu a procura de algo menos insuportável que a presença da tia. Vagando pelas ruas do centro antigo onde crescera, parou em frente a uma vitrine. E ali ficou, por longos minutos, mergulhado em uma reflexão, coisa que antes nunca fizera. Nada se especial havia naquela vitrine, já havia passado por ali centenas de vezes e era sempre a mesma coisa, TVs exibindo em sincronia um programa qualquer. O que viu naquela manhã, porém, foram mais que imagens mudas de um programa matinal. A TV mostrava um homem, com roupas em frangalhos, pele queimada pelo sol, rosto demasiadamente envelhecido para idade que possuía, com uma barba ainda pueril. Fitou seus olhos de desesperanças e só aí se deu conta que a triste figura do tal homem era o reflexo do menino que um dia fora, e que desaparecia ali.

Seguiu sem destino por horas. Buscava descobri como aquilo acontecera, quem era aquele que agora lhe aparecia sem avisar, tão de repente. Era apenas um menino quando saíra de casa pela manhã, não havia como retornar homem, assim, sem explicação. Não havia como continuar subjugado a partir dali. Fez, então, o que havia para ser feito.

Como o dia parecia já querer ir embora, sem que ninguém o percebesse, entrou em casa, pegou as poucas roupas ainda utilizáveis e foi. Não sabia para onde, nem porque ia. Apenas seguia em busca de um algo que pudesse chamar de vida e, quem sabe, felicidade.

Abrigo Noturno


A noite é meu melhor abrigo quando, sem saber porque, sinto uma desesperança se aproximar. É como se com a escuridão que domina o céu me servisse de esconderijo habitado apenas por pequenos pontos luminosos, fieis e silenciosos interlocutores.

Pode ser também que minha afinidade com o anoitecer seja apenas satisfação inconciente por saber que se aproxima o fim de mais um dia. Não que desgoste da vida, ou seja depressivo a ponto de não querer a luz do sol. Apenas os dias tem sido tão difíceis, vejo tanto por fazer e quase ninguém sinceramente disposto a se assumir como timoneiro que duvido do meu desejo de melhorar o mundo.

Não me acredito especial por qualquer motivo que seja. Talvez disfarce bem quando preparo um discurso com boas palavras e ponho no rosto a convicção absoluta naquilo que pronuncio. De fato, duvido de mim mesmo, da vida que há por vir, das intempéries de um amanhã excessivamente desafiante para alguém fatigado por suas incertezas.

Confesso que sinto um desejo imenso de tornar as coisas melhores para os que me cercam. Preciso, até, disso para completar algo ainda incompleto cá dentro. No entanto, as vezes, vejo tanto do que há de ruim no mundo, nos atos das pessoas, nos meus próprio, que desacredito de tudo. É sempre mais do mesmo: disputa de egos, quem “sabe” mais, tem mais, é mais... Por quê?? Ninguém mais crer que menos pode ser melhor, que estar um pouco abaixo pode ser mais agradável!? Já sei, já sei: discurso dos fracos, esse. Coisa de quem nunca será o melhor em nada, um fracassado. É que sempre acreditei que havia algo além do ser, do ter, do papel encenado, da disputa despropositada. Mas já não estou tão certo assim.

Aí, então, fraco eu, não resisto e me permito a diversão. Seliciono os mais vis, desleais e os observo, pretenciosamente. Coisa ilegal o que faço, mas que adoro. Invado a privacidade alheia, sorrateiramente, aos poucos. Claro que existem os mais precavidos que desde muito se cercaram de artefatos de segurança. Até funciona, a dissimulação, o desinteresse calculado, as mensagens antagônicas (só os mais espertos utilizam esse recursso. Os bobos morrer negando – uma confissão!). Só que não há como. E são os detalhes que denunciam, sempre, a verdade oculta por máscaras, palavras, pequenas educações. O real (se existe) não se entrega facilmente. Fica escondido, lançando pedras sem mostrar a mão. Só não invisível. Basta mesmo apenas observar, com paciencia, e por uma fresta, mínima, aquilo indesejado, feio, condenável, se revela profundamente enraizado no Samaritano polido e comportado.

Não deveria abalar-me por isso: assim mesmo, o ser humano. Tendo me habituar a essa idéia. Sem pressa, deixo que aconteça. Acompanhado pela pouca luz, pela paz do vento frio que a noite traz, sinto o peito mais leve. Ainda há muito cá dentro, e não é vazio o que sinto. Apenas conforto, apesar das dores. Quem sabe um dia não mudo de gosto, escrevo sobre o sol, a praia, o dia. Por agora, fico com a noite, mais amena, tranquilizadora, e que me faz sentir seguro.

Não deveria abalar-me por isso: assim mesmo, o ser humano. Tento me habituar a essa idéia. sem pressa, deixo que aconteça. Acompanhado pela pouca luz, pela paz do vento frio que a noite traz, sinto o peito mais leve. Ainda há muito cá dentro, e não é vazio o que sinto. Apenas conforto, apesar das dores. Quem sabe um dia não mudo de gosto, escrevo sobre o sol, a praia, o dia. Por agora, fico com a noite, mais amena, traquilizadora, e que me faz sentir seguro.

Um dia, mudo e escolho a insegurança. Ei de buscar a aventura.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Não vale a leitura!!

Perdido na madrugada, escrevo sobre nem sei o que... As vezes tudo é muito complicado difícil, triste. Dá uma desesperança, medo, vontade de ir embora, mas nem sei pra onde.

*** (até quando?!)

Sempre acreditei que o mal está mais nos olhos de quem vê do que em quem supostamente o pratica. E talvez seja mesmo assim. É como se fosse um modo de se tornar melhor fazer do outro, mesmo que apenas em pensamento, um pouquinho pior, com defeitos e pecados dignos de condenação.
Confeço que parte disso há em mim. Difícil admidir que se é menor, mais fraco, mais feio... Quando tal é tão gritante que não dá para negar, resta divagar sobre a personalidade de um alvo incalto, de sua personalidade, seu carater e ações invariavelmente tão condenáveis.
Alguém diria "é natural, inerente ao ser humano, afinal, perfeito mesmo, só Cristo...". Duplamente leviano. As vezes acredito que guerras só existem porque assim os envolvidos querem. Algo como se brigar, mutilar (mesmo que com palavras) fosse vital, como se para viver fosse preciso matar, de dor, de medo, de desprezo, matar com mentiras...
Sei, tudo complexo e mal escrito demais. Loucura minha querer vomitar às 2 da madrugada. Achei que o que há cá preso sairia fácil, mas depois de tanto tempo, acho que grudou em mim. Durmo agora para tentar desfazer tamanha adesão. Amanhã, pode ser, sai algo digno de registro daqui. Espero não sufocar até lá.

'Güento?!

A Amanda e João

Há alguns meses minha amiga Amanda (Malcher) resolveu ressucitar seu antigo blog que havia sido esquecido. Acompanhei por alguns dias suas postagens, mas logo acabei deixando o bom hábito de lê-la...
João, o amigo mais loucamente original que tenho, resolveu, por sua vez, cria também um blog. E o tem feito com maestria. muito bom lê-lo, mesmo que não atualize todos os dias. Escreve em verso, mas ainda vou convence-lo de aderir à prosa.

*** (alguém entenderá!!)

Cedo, então, a tentação e ressucito eu, agora, meu antigo pouco utilizado blog. Nada de tanta originalidade, como o de John, muito mesmo toda criatividade de Amanda... Apenas coisas minhas, desprovidas da pretenção de serem lidas e apenas escritas para aliviar o peito sufocante.
Queria mesmo relatar um pouco da vida, e da dor que há nela, do medo, da coragem, do desejo, das coisas que nos faz continuar vivendo, mesmo sem ter opção, seguindo apenas o caminho, sem saber onde se chegará...
E já começam meus devaneios!